Mas esse é demais, por favor, tire 10 minutinhos e leia, garanto que você vai adorar.
Mulher de um homem só
Ela é como o urso panda, está quase extinta do planeta. Quando alguém a ouve dizendo “sou mulher de um homem só”!, corre para o celular mais próximo e chama a imprensa para documentar. Quem é, afinal, essa mulher tão rara?
A mulher de um homem só casou virgem com um escritor que detesta badalação. A última festa em que ele compareceu foi a do seu próprio casamento, a contragosto. Ele só gosta de música barroca, uísque e poesia. Não quis ter filhos. É um homem terrivelmente só que se casou apenas para que alguém cozinhasse para ele, pois odeia restaurantes.
A mulher do homem só tenta animá-lo. Convida-o para subir a serra e comer um fondue. O homem faz que não com a cabeça. A mulher convida para ir a uma feira de antiguidades. Ele dá um sorriso sarcástico. Ela convida para ir na CasaCor. Ele tem espasmos. Ela convida para um teatro. Ele pega no sono antes que ela diga o nome da peça.
O homem só gosta de ficar em casa. Não vai ao cinema, nem a parques, nem a bares. Não visita ninguém. Não votou na última eleição. Não comparece às reuniões de condomínio. Tem alergia a gente.
A mulher do homem só tentou festejar os 50 anos dele. Convidou os poucos conhecidos do marido: um irmão, o editor e a mulher deste. Comprou cerveja, colocou o CD do Paulinho da Viola e flores nos vasos. Os convidados chegaram e se foram sem ouvir a voz do homem só. Ele apenas resmungou um obrigado quando recebeu um livro do editor e disse qualquer coisa inaudível ao ganhar meias do irmão. Passou calado a noite inteira. Quando pediu licença para ir ao banheiro, não voltou mais.
A primeira vez que a mulher do homem só disse “sou mulher de um homem só” foi para o motorista de táxi, que ficou muito impressionado. Ela era jovem, bonita, mas tinha uma tristeza comovente no olhar. Era a última corrida dele e, impulsivamente, convidou-a para uma caipirinha. Ela aceitou e, pela primeira vez em muitos anos, teve uma noite animada.
A segunda vez que ela disse “sou mulher de um homem só” foi para o vizinho do sexto andar. Estavam sozinhos no elevador e ele fingiu não ouvir. Nunca haviam trocado nem um bom-dia, quanto mais uma confidência. Mas ela repetiu: “sou mulher de um homem só”. Dessa vez falou de um jeito tão carente que ele se viu obrigado a tomar uma providência. O sexto andar acabou malfadado no prédio.
A mulher do homem só, então, passou a ter a agenda cheia: o professor de computação, o gerente do banco, o dono do posto de gasolina. Vivia para cima e para baixo com seus novos amigos: cinema, shopping, vernissages. Não corria o risco de encontrar o marido em nenhum desses lugares. Começou a usar decotes, maquiagem e ria alto. Nunca se sentira tão feliz. Surgia cada dia com um parceiro diferente nas festas, nas inaugurações de lojas, nos passeios pelo mercado público. Ganhou má fama. E quanto mais o povo falava, mais ela desdenhava. Ninguém fazia a mínima idéia do que era ser mulher de um homem só.
Martha Medeiros – Agosto de 1997
Livro: Trem-bala
e ai, gostou ?? eu conheço algumas mulheres de um homem só. E você?? Conhece alguma ??
12 comentários:
Verdade Silvana , esses 10 minutinho foram maravilhosos. Fui imaginando "A Mulher de um Homem só.
Um belo conto. Quero mais...
Xeros
Duplo sentido no tema...mas o conto é excelente!
Facil ser mulher de um homen só quando o mesmo te preenche em todos os sentidos..
Mais é muito dificil ou melhor quase impossivel ser mullher de um homem solitario.
Bjs
oi, Silvana, são poucas, mas conheço sim mulheres de um homem só! rs... Belo tema. Passe lá no Pedra do Sertão também. abç
Muito show! Pelo menos ela tentou anima-lo...e aproveitando que ele não ia a lugar nenhum...ela se fez presente a TODOS!!...rsrs.
Dez minutos ótimamente aproveitados!! Vc podia nos presentear com um conto de vez enquando...que tal?? Quando a vóia estiver beeeemm longe...rs.
Beijos queridíssima!
oi!! Que delicia de conto!
Muitas mulheres cansam-se de ser a mulher de um homem só, por culpa deles mesmo!
beijos
Além da Madalena temos tb a Martha em comum, né?!
Adorei esse conto quase Rodriguiano, né! rs
Xerinhos
Paty
Sil, lindo e pertinente. E pelo jeito ele continuara ainda mais só.
Obrigada pela visita, sempre to aqui,mas pra falar a verdade, dia desses tua "vóia" pegonimim...
Bjs!
Oi Sil,
que legal esse conto! Amei! Foi uma delícia ler esse conto até o final! Obrigada!
Beijos!!!
OI fABI - AH A MARTHA MEDEIROS-
JÁ LEU O LIVRO DOIDAS E SANTAS?
TAMBÉM SÃO CRÔNICAS - ESTA MULHER ROUBA MINHAS PALAVRAS, ELA ENTRA NO MEU CEREBRO E ROUBA TODAS AS IDEIAS-
UIII até que foi bom pra ela - ser mulher de um homem só -
só meSMo - solidao
porque quando li pensei que era mulher de um só- e tem que cuidar com estas mulheres rsrs
se eu conheço ? pelos menos meia duzias de infelizes - mas que infelizmente nunca tiveram coragem de abordar os vizinhos RSRS
bj
lu
Também com um homem desses??? kkkkkkkkk
Beijos
Trem Bala é meu livro favorido da Martha, o que tem mais coisas boas.
Beijooo
Sil, muito bom este texto!!!
Amiga, bora fazer umas artes aí, hein, e postar tudinho depois, tá? rsrsrsrsrrs
Eu sou louca pra ir pra Pedreira, ainda não conheço... deve ser mará, né?
Beijossssssssssss pra ti
Vero
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